13.31 – percepção – Capítulos 4 e 5
IV
É inquestionável a influência que a linguagem exerce sobre as crenças e automaticamente atua sobre o comportamento. Toda a atual gama de percepção consciente é disposta através da linguagem. É um instrumento tão poderoso que age no íntimo da percepção de mundo, infiltrando facilmente no subconsciente e determinando ou programando a atuação na vida. Através da linguagem pode-se ter sensações, visões, audições, sentir cheiros, gostos e pereber fisicamente ou psicologicamente o que se conhece na experiência individual. Isso se deve também ao fato do ser humano ter desde sempre decodificado as coisas e experiências em um processo simbólico linguístico e ter associado qualquer fenômeno a esse processo.
Existem quilos e quilos de materiais teóricos e pesquisas práticas sobre o quão forte e determinante na existência humana é o seu sistema de línguas e o quanto esta ferramenta pode ser utilizada em prol da mudança comportamental, para melhoria da qualidade de vida das pessoas e para evolução no aprendizado, influenciando diretamente no conhecimento que possuímos (ver por exemplo Gramática Tranformacional Gerativa).
A hipnose é uma das provas mais claras da influência da linguagem sobre o sistema neurológico. Hipnose é apenas um termo, uma nominalização que tenta definir algo específico, mas que na realidade não define nada além de comunicação entre duas ou mais pessoas ou comunicação consigo mesmo que leve a algum resultado utilizando de acessos incoscientes e conscientes. É difícil explicar esta terminologia mas é fácil entendê-la se colocá-la dentro do contexto cotidiano. Qualquer imaginação pode ser considerada hipnose, pois a atenção estará focada em uma distorção da realidade provocando um estado alterado. Erickson sempre usava a expressão “transe comum nosso de cada dia” quando falava sobre aqueles momentos em que “saímos de foco”, ou “silenciamos a mente” ou “neutralizamos as sensações”. Este estado alterado denominado transe pode ser tão somente quando um pensamento daquele objeto na vitrine de uma loja percorre o cérebro numa imagem cheia de sentimentos! Através do que se denomina fenômenos hipnóticos pode-se chegar a coisas inimagináveis, como por exemplo anestesia geral em cirurgias, onde o indivíduo não pode receber anestesia química, dentre muitas outras utilizações, além da terapia.
Vale dizer que é evidente que a interferência da linguagem não atua somente sobre o comportamento e percepções, mas também sobre os sistemas físicos, como controle da temperatura, pressão arterial e respiração, inclusive com estudos na área de plasticidade cerebral onde através de comandos linguísticos pode-se reconstruir ligações neurológicas, concepção que enriquece profundamente a área da medicina e saúde.
Apesar da linguagem ser a maior influenciadora no que se refere a percepção do mundo e consequentemente comportamento, ela falha no sentido de ter uma relação mais íntima e “honesta” com as outras pessoas, pois não apresenta toda a gama de respostas que o resto do corpo estará apresentando na ato social de comunicar. Para se ter esta relação profunda com os outros e até consigo mesmo, é necessária uma especial atenção para o outro lado da moeda, o lado mais complexo e maior, o sistema analógico de comunicação humana.
V
Quem já assistiu ao seriado “Lie to me”, onde o protagonista é um especialista em identificar e analisar expressões faciais, sabendo se o analisado está falando a verdade ou não, pode ficar facinado em saber que não há ficção nisso, pois as microexpressões realmente sempre estiveram nas faces e corpos das pessoas, mostrando o que se passa de fato dentro delas (ver Paul Eakman). O ser humano é um organismo integrado e expõe através de seu corpo aquilo que sente, pensa, ou até mesmo aquilo que não está no limite da sua consciência. Não percebe este fato numa comunicação, pois dá total atenção a porção digital da mesma, sendo que esta porção supõem-se corresponder a apenas 10% ou menos de nossa comunicação (ver Bateson).
No caso do seriado americano, é claro que por ser uma produção para fim de entretenimento, há exageros de certos aspectos, mas se ter em mente o enorme leque de possibilidades e a quantidade destes “sinais” que são mostrados a todo momento, o processo real é muito mais refinado e abrange muito mais partes do corpo e comportamento do que o exposto no filme.
Na década de 70 houve uma acensão no que diz respeito aos estudos dos sinais analógicos emitidos pelo ser humano em seus mais variados aspectos de comportamento. Experiências sistemáticas identificaram que a fundo as pessoas são muito mais fenomenolôgicas do que se pensava, isso em termos físicos, apenas levando em consideração seu complexo conjunto sensorial, ferramentas da percepção, diversos sensores que captam a realidade indiferente se irão decodificar esta captação ou não. Nesta época nasceu a terminologia PNL que abrange todo o estudo comportamental e neurológico do ser humano e através destes estudos pode-se ter uma noção ainda maior de como funciona a máquina humana. Uns dos grandes avanços nesta área, para se entender e melhorar nosso sistema de captação de “sinais”, foram as noções de biofeedback, sistemas representacionais e âncoras, que serão descritas mais adiante.
É extremamente difícil, senão impossível controlar as expressões autônomas incoscientes, incluive, se pensar a respeito e analisar o material que se tem a disposição sobre o assunto, conclui-se que quem comanda o “jogo de existir e agir aqui e agora” é esta parte que denominada incosciente, ou seja, tudo o que estiver fora dos limites da consciência. Só para esclarecer um aspecto da atuação destas terminologias no modelo individuais, os elementos no incosciente, podem vir a tornar-se elementos conscientes instantaneamente. Se alguém disser “preste atenção na sua orelha direita” é possível que automaticamente quem escutar esta frase tenha ou alguma sensação na orelha direita, ou uma imagem, ou que diga a si mesmo internamente: – não é que eu tenho uma orelha direita mesmo! Ou seja, através de algum destes processos ou de todos juntos se torna consciente daquele material que outrora estava nos consfins do subconsciente. A informação passa por uma espécie de julgamento quando está a nível consciente, julgamento este que não existe na parte inconsciente, que atua somente perante as escolhas que tem. Então quando se tem uma sensação ou um pensamento, uma imagem ou algum som, cheiro ou gosto, qualquer experiência interna mental ou interna física, alguma expressão sucederá no nosso corpo, estas expressões podem estar fora do alcanse das críticas racionais, não serão percebidas de fato, podem até serem percebidas, mas apenas após elas terem acontecido.
Por ter este complexo sistema que mostra o “que somos” num momento específico em uma comunicação a dois ou mais, automaticamente se tem também a capacidade de olhar, ouvir ou sentir estes “sinais”, precisando apenas se atentar a isso e treinar o sistema sensorial a fim de melhorar esta habilidade. Quando um casal mora junto acontece uma espécie de intimidade que faz com que sejam mais sensíveis um ao outro no aspecto de identificar (incoscientemente ou não) estes sinais analógicos. O costume de morar junto leva ao treino, mesmo que sem pensar, desta habilidade, e apenas de olhar para pessoa, de longe, já se pode saber se o dia dela foi bom ou não, se ela está triste, feliz, alegre ou se quer lhe comer vivo. O marido faz uma pergunta a esposa e no fundo ele não precisa de uma resposta verbal, esta resposta ele já obteve muito mais veloz e complexa, com muito mais detalhes, das expressões físicas, coloração da pele, direção ocular (será estudado mais adiante), posição do corpo, curvatura, umidade nas mãos e mais uma infinidade de sinais que podem estar presentes na comunicação incosciente. Isso acontece inconscientemente com os casais, amigos, familiares e etc., mas é possível o treino afim de ter um sistema mais lapidado e sensível para entender melhor e ter um contato muio mais íntimo e amplo com outras pessoas, além de melhorar as relações que já existem.
As ferramentas que estão a disposição de todos e que foram descobertas ou “criadas”, funcionam muito bem na área da terapia e comunicação. Algumas são extremamente úteis no processo de aperfeiçoamento dos canais receptivos e consequentemente amadurecerimento do biofeedback humano.
Para aprender a ter a habilidade de perceber e receber através dos sentidos as mensagens enviadas pelos sentidos de outrém, é preciso primeiramente compreender quais podem ser estes sinais e o que esta área da psicologia e comunicação proposta neste livro já pesquisou, experimentou e descreveu sobre estes sinais.
Entende-se por sistemas representacionais os meios pelos quais as pessoas utilizam para expressar ou absorver uma mensagem. Este sistemas podem ser visuais, cinestésicos ou auditivos, claro que também abordariam outros sentidos, mas como estes são os mais utilizados será destacada sua importância. Cada indivíduo utiliza destes sistemas, e muitas vezes um sistema se sobressai, ou dois e vice-versa.
O sistema visual corresponde aquele que percebe ou decodifica a percepção por meios visuais, a pessoa que tem este sistema mais desenvolvido utiliza de predicados como veja, imagina, está claro, uma luz nas ideias, uma resposta brilhante e etc, quando chega a algum ambiente observa visualmente os detalhes, grava as coisas de forma visual e também projeta nos pensamentos desta forma. Para uma pessoa que tenha este sistema aguçado, uma imagem vale mais do que mil palavras.
O sistema auditivo é aquele sistema que engloba as frequências audíveis e que utiliza da memória auditiva para construir a experiência. A pessoa que tem este sistema mais refinado, utilizando-o com maior frequência, na comunicação aplica predicados como não me soou bom, escuta só, ouça esta coisa, deixa eu falar e etc. Está mais “antenado” ao ritmo, tom, timbre, cadência. O sistema auditivo talvez seja o mais comum dentre os sistemas, é muito comum as pessoas terem uma voz interna, com modos diversos de falar consigo mesmas.
O sistema cinestésico envolve o sentido do tato e sentidos como pressão, temperatura, tremor, textura e umidade e etc. A pessoa sobre o domínio deste sistema é extremamente sensitiva, usa predicados como perceba isso, sinto que não vai dar certo, dá um tapa neste projeto para mim e etc. São pessoas dotadas de forte “intuição” e que percebem de fato coisas antes dos outros sistemas.
O ser humano não atua em um sistema apenas, na sua forma de ver e se expor ao mundo. São utilizados todos os seus sistemas em conjunto (e ainda outros sistemas como olfato e paladar que não são necessários para esta explicação), sendo que na maioria das vezes um se prevalece sobre os outros fazendo com que o modelo de mundo, a percepção das coisas, sejam mais uma vez limitados por não possuir pontos de vista amplos de outros sistemas representacionais.
Nas relações entre as pessoas, estes sistemas geram total influência sobre as situações. Muitas vezes há um choque entre dois indivíduos com sistemas diferentes. Uma pessoa extremamente visual chega perto de uma pessoa altamente cinestésica e diz “Ei, veja só como as coisas estão claras, imagina agora se eu ponho uma cor neste projeto e finalizo-o brilhantemente”, a pessoa cinestésica não terá como absorver a informação, pois não chegou em seus canais com compatibilidade, para ela seria melhor dizer “Ei, perceba como as coisas são sólidas, você vai se sentir demais quando eu der um tapa daqueles no projeto e finalizá-lo explosivamente!”. É tudo uma questão de empatia entre o mesmo sistema de representação. Da mesma forma que um casal pode brigar por um dos dois discutir um tema cinestésicamente, tocando o outro e gesticulando, enquanto o outro é uma pessoa direcionada para o sistema auditivo, quando o cinestésico aumenta o tom de voz o auditivo percebe como afronta e revida dando início a uma bagunça sem sentido por um motivo claro, forte, sonoro, que é: as pessoas podem ter sistemas reprensentacionais diferentes, tornando assim mais peculiares ainda. Um dos objetivos para se obter bons resultados no treino das aptidões que possuímos “enferrujadas” é pensar nestes sistemas e analisar, ouvir o que as pessoas falam e tentar se enquadrar no mesmo sistema ou ocilar sistemas para que haja uma melhor compreensão e maior intimidade. É importante, para refinar estas novas habilidades, que se decida a dispor de um tempo cosnciente para observar os diálogos entre as pessoas nos locais que frequentam, e além das conversas verbais, também observem as expressões analógicas destes indivíduos, como eles se comportam. Num primeiro momento apenas observar e tomar notas do que está vendo, ouvindo e percebendo, tentando ser o mais específico possível nas anotações, sem incluir hipóteses e alucinações. Por exemplo se estiver em um restaurante e observar um casal ao lado conversando, pode-se anotar algo como “ele disse: – estou com medo de isso não dar certo! – Mãos tensas, olhos semiabertos, pés batendo no solo, pernas com um leve balançar, etc.” Ou “ela está com um braço sobre a mesa e o outro sobre a perna, sua pele enrubreceu levemente, sua boa está semiaberta e etc”. Este simples treino tem dois propósitos, primeiro é que se alguém decide efeutuá-lo conscientemente, já se colocou num estado mais atento que iniciará um processo incosciente de captação da informação e segundo por fazer com que aprenda conscientemente certos sinais da sua própria comunicação que antes não havia se dado conta.
As pessoas podem se surpreender, e muito, apenas observando conscientemente, com este estudo do comportamento humano em mente, os outros ao seu redor. Cada parte do corpo se comunica, basta estar atento há alguns dos sinais expostos para a comunicação ser muito mais útil.